quinta-feira, 20 de junho de 2013

IMENSIDÃO GALÁTICA... A FORÇA E A BELEZA DA VIA-LÁCTEA ( Astronomia )

Imensidão galática


Os astrônomos apontam seus telescópios para descobrir a força e a beleza da Via Láctea

É difícil ser modesto quando se vive na Via Láctea. Nossa galáxia é maior, mais brilhante e mais maciça que a maioria das outras. O disco de estrelas da Via Láctea, observável a olho nu, se estende por nada menos que 120 mil anos-luz. Em torno dele há outro disco, composto sobretudo de hidrogênio. E, envolvendo tudo o que os nossos telescópios conseguem captar, ainda existe, fora do alcance desses instrumentos, um enorme halo de matéria escura. Embora não emita luz, essa matéria tem uma massa que sobrepuja em muito a de centenas de bilhões de estrelas da Via Láctea, conferindo à galáxia uma massa total equivalente a 1 trilhão ou 2 trilhões de vezes a massa do Sol. Nossa galáxia é tão imensa que dezenas de galáxias menores giram em torno dela, feito luas ao redor de um planeta gigante.
A Via Láctea conta com, no mínimo, um planeta com vida inteligente. Galáxias gigantes, como ela e sua vizinha ainda maior, Andrômeda, têm condições de produzir abundante suprimento de ferro, oxigênio, silício, magnésio e outros elementos mais pesados que o hélio. Forjados pelas estrelas da Via Láctea, esses elementos pesados são os blocos básicos dos planetas terrestres.
Os elementos pesados também são essenciais à vida, como se comprova pelo oxigênio que respiramos, o cálcio dos ossos e o ferro no sangue. Em uma galáxia menor, quando uma estrela explode, essas matérias-primas são arremessadas no espaço e se dispersam. Na Via Láctea, porém, esses elementos encontram o gás e a poeira interestelares e são contidos pela força do imenso campo gravitacional. Tais obstáculos fazem com que percam velocidade e possam enriquecer as nuvens de gás com os ingredientes necessários para a formação de gerações de estrelas e planetas. Foi o que ocorreu há 4,6 bilhões de anos, quando o Sol e a Terra se originaram de uma nebulosa interestelar hoje desaparecida.
Pelo fato de vivermos no interior da Via Láctea, sabemos menos a respeito de sua aparência geral que a de galáxias mais distantes - assim como, sem um espelho, conhecemos melhor o rosto dos amigos que o nosso. A despeito disso, na última década os astrônomos fizeram várias descobertas sobre a galáxia, começando por revelações acerca do buraco negro em seu âmago.
Um véu de poeira cósmica nubla a galáxia sobre a cratera Haleakala, no Havaí. Panorama composto de três fotos unidas nas laterais (na foto abaixo)
Estrelas: astrônomos direcionam seus telescópios para a Via Láctea
Todas as estrelas da Via Láctea giram em torno desse buraco negro, denominado Sagitário A* (abreviado para Sgr A*). O Sol, localizado a 27 mil anos-luz do centro galático, completa uma volta em torno dele a cada 230 milhões de anos. No espaço de apenas 1 ano-luz a partir do buraco enxameiam mais de 100 mil outras estrelas, prisioneiras de seu campo gravitacional. Algumas delas levam só uns poucos anos para completar suas órbitas. Essas trajetórias revelam que o Sgr A* possui uma massa 4 milhões de vezes maior que a do Sol, ou seja, um tanto mais maciço do que se imaginava uma década atrás.
De tempos em tempos, o buraco negro engole um pouco de gás, um planeta desgarrado ou uma estrela. O atrito e a gravidade aquecem a vítima a temperaturas tão altas que ela emite berros sob a forma de raio X. Eles iluminam as nuvens de gás próximas, que acabam preservando um registro de outros objetos ingeridos no passado. Por exemplo, em 2004 os cientistas captaram ecos de raio X em uma nuvem gasosa a 350 anos-luz do buraco negro. Como os raios X se deslocam à velocidade da luz, esses ecos indicam que algum objeto caiu no buraco negro há 350 anos.
O buraco negro também catapulta para longe as estrelas. Em 2005, os astrônomos identificaram uma estrela que se movia com rapidez a 200 mil anos-luz do centro galático. "Foi uma descoberta casual", comenta Warren Brown, do Centro Harvard-Smithsonian de Astrofísica. Ele buscava "filamentos estelares" - resquícios de galáxias menores destroçadas pela força gravitacional da Via Láctea - quando topou com uma estrela na constelação Hydra afastando-se do meio da galáxia a 709 quilômetros por segundo, ou 2,55 milhões de quilômetros por hora. A essa velocidade, ela vai escapar do campo gravitacional da galáxia e se lançará no espaço intergalático. Até 2010, Brown e outros astrônomos haviam descoberto outras 15 dessas estrelas hipervelozes.
Em um assombroso exemplo de presciência, Jack Hills, na época trabalhando no Laboratório Nacional de Los Alamos, no Novo México, havia previsto a ocorrência de um fenômeno similar. Em um artigo publicado em 1988, Hills afirmava que, se uma estrela binária - ou seja, duas estrelas que giram uma em torno da outra - chegasse bem perto do Sgr A*, um de seus componentes poderia ser atraído para o buraco negro, passando a percorrer uma órbita mais próxima dele e liberando com isso enorme quantidade de energia. Portanto, em conformidade com as leis físicas de conservação da energia, a outra estrela receberia um impulso igualmente poderoso, sendo arremessada para longe a uma velocidade tremenda.
A despeito da violência que reina em torno do Sgr A*, o núcleo galático é um lugar produtivo. Como as estrelas estão mais apinhadas no centro da galáxia, elementos pesados e fecundos são mais abundantes ali. Mesmo nas proximidades do Sol - uma brilhante estrela amarela no meio do caminho entre o buraco negro e a borda do disco estelar -, há muitas estrelas recém-nascidas e dotadas de discos de gás e poeira, os quais sobrevivem durante milhões de anos, ou seja, tempo suficiente para o surgimento de planetas.
Em contraste, são poucas as possibilidades de formação de planetas na borda da galáxia. Em 2009, Chikako Yasui e colegas identificaram 111 estrelas recém-nascidas em uma área periférica da galáxia, duas vezes mais distantes que o Sol em relação ao centro galático. Essas estrelas apresentavam quantidade pequena de elementos pesados - o conteúdo de oxigênio delas era um quinto do existente no Sol. Embora tais estrelas tenham apenas meio milhão de anos de idade, a maioria já perdeu os discos de gás e poeira nos quais se formam os planetas. Sem disco não há planeta e sem planeta não há vida.
As estrelas com teores ainda menores de oxigênio e ferro nos proporcionam vislumbres do nascimento da galáxia. Situadas no halo estelar que se estende acima e abaixo do disco galático, tais estrelas são tão antigas que se formaram antes que as primeiras gerações de estrelas tivessem a chance de produzir elementos pesados. Com isso, uma estrela típica do halo possui apenas 3% do conteúdo de ferro encontrado no Sol.
Para estabelecer a idade do halo estelar e, portanto, da galáxia como um todo, os astrônomos costumam recorrer ao estudo dos aglomerados globulares - concentrações brilhantes e densas de estrelas tão velhas que suas companheiras de vida mais breve já morreram. No entanto, essas datações dependem das hipóteses sobre o modo como vivem e morrem as estrelas.
Felizmente, há outra maneira de se calcular a idade da galáxia. Anna Frebel ainda era estudante na Universidade Nacional da Austrália quando começou a se interessar por estrelas no halo. "Quero descobri-las porque assim posso retroceder no tempo", explica ela. Em 2005, ao examinar a constelação de Libra, Anna conseguiu identificar uma estrela do halo com apenas um milésimo do conteúdo de ferro do Sol - um teor muito baixo, mesmo pelos padrões do halo, que indica que se trata de uma estrela tão primitiva que provavelmente surgiu do gás enriquecido por uma única supernova. E, ao contrário da maioria das supernovas, a estrela havia lançado no espaço muitos elementos mais pesados que o hélio, entre eles tório e urânio radiativos.
Para Anna, essa foi mesmo uma estrela da sorte. Como esses elementos radiativos se desintegram em ritmo constante, a avaliação da quantidade atual deles na estrela permitiu-lhe calcular a sua idade: por volta de 13,2 bilhões de anos. Embora esse número tenha uma margem de erro de 2 bilhões a 3 bilhões de anos, ele confere com as estimativas feitas com base no estudo dos aglomerados globulares, e sugere que a Via Láctea é apenas um pouco mais jovem que o próprio universo, que tem 13,7 bilhões de anos. A poderosa galáxia, cujas incontáveis estrelas mais tarde tornariam possível a vida na Terra, não esperou muito tempo para nascer.
GALERIA DE FOTOS:
Edição 129 – Via láctea -Centro da Via Láctea
Na ampliação bem mais alta de um telescópio amador, a poeira escurece o centro da galáxia, ao mesmo tempo em que as regiões coloridas de Antares e Rho Ophiuchi brilham à direita.
Edição 129 – Via láctea -Estrelas brilhantes, maciças, poeira
O retrato infravermelho obtido pelos telescópios espaciais Hubble e Spitzer mostra aglomerados estelares brilhantes e centenas de milhares de estrelas maciças em meio a poeira e turbilhões de gás ionizado aquecido. O buraco negro da Via Láctea oculta-se no luminoso aglomerado central, à direita.
Edição 129 – Via láctea -Borda da Via Láctea
Mosaico panorâmico da borda da galáxia.
Edição 129 – Via láctea -Laguna, vista do observatório de La Silla
O telescópio de 2,2 metros do observatório de La Silla, no Chile, bem mais potente, faz foco na nebulosa Laguna, que tem cem anos-luz de diâmetro.
Edição 129 – Via láctea -Braços da Via Láctea
Os dois principais braços em espiral da Via Láctea, em uma concepção artística acima, estendem-se das extremidades de uma barra brilhante de estrelas. Braços menos proeminentes são em sua maior parte gás e criadouros de estrelas.
FONTE: Revista National Geographic Brasil

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